{"status":200,"response":{"result":"PUBLIC_ARTICLES_RETRIEVED","data":{"count":1,"content":[{"id":"5fd8b0e9a64ee11b06345967","updated":"2020-12-15T20:27:34.538Z","created":"2020-12-15T12:49:44.861Z","statuses":{"approval_status":"approved","publish_status":"published","visibility_status":"public","has_pending_changes":false,"is_pinned":false,"is_paywall_disabled":false,"scheduled_date":null,"rejection_reason":null},"metadata":{"location":"home","location_slug":"blog","content_type":"post","publish_date":"2020-12-15T20:27:34.763Z","likes_count":0,"bookmarks_count":0,"comments_count":0,"score":"2020-12-15T20:27:34.763Z","sharing_title":"O Homem do Saco","sharing_description":null,"sharing_image":"https://5f1ae31a2b397e299b74e383.redesign.static-01.com/f/images/87ef2556b16875ffb166d49c7b5d61fdcfa8f53d.png","tag_ids":["5fa93e8322239f6c57eea52d","5fd8b0e8a64ee11b06345963","5fd8b0e9a64ee11b06345964","5fd8b0e9a64ee11b06345965","5fd8b0e9a64ee11b06345966"],"author_user_id":"5f76627a3a124d3333c2e242","moderator_user_id":"5f8ddcae6452e87432b42d25","project_id":"5f1ae31a2b397e299b74e383","course_id":null,"course_module_id":null,"group_id":null,"version":1,"tags":[{"id":"5fa93e8322239f6c57eea52d","title":"familia","slug":"familia","project_id":"5f1ae31a2b397e299b74e383"},{"id":"5fd8b0e8a64ee11b06345963","title":"educacao","slug":"educacao","project_id":"5f1ae31a2b397e299b74e383"},{"id":"5fd8b0e9a64ee11b06345964","title":"criancas","slug":"criancas","project_id":"5f1ae31a2b397e299b74e383"},{"id":"5fd8b0e9a64ee11b06345965","title":"medo","slug":"medo","project_id":"5f1ae31a2b397e299b74e383"},{"id":"5fd8b0e9a64ee11b06345966","title":"cenas","slug":"cenas","project_id":"5f1ae31a2b397e299b74e383"}]},"content":{"title":"O Homem do Saco","slug":"o-homem-do-saco","cover_image":"https://5f1ae31a2b397e299b74e383.redesign.static-01.com/l/images/87ef2556b16875ffb166d49c7b5d61fdcfa8f53d.png","headline":"Saí de casa apressada para o encaixe que me fariam na consulta ao oftalmologista. Toda aquela adrenalina de me arrumar, pegar a máscara, sair, dirigir até o consultório, estacionar, lavar","main_content":"

Saí de casa apressada para o encaixe que me fariam na consulta ao oftalmologista. Toda aquela adrenalina de me arrumar, pegar a máscara, sair, dirigir até o consultório, estacionar, lavar as mãos, observar o ambiente com a neura da Covid, mapear as janelas, e dizer \"Valendo!\". Cheguei naquela adrenalina, me apresentei na recepção, peguei uma água e estava pronta para esperar o encaixe.

Consegui uma promoção de lentes multifocais e fui aproveitar meu último mês de plano de saúde para deixar o grau em dia.

O consultório fica num sobrado na Vila Nova Conceição, onde há 5 salas para atendimento, laboratório para exames, lojinha, toalete. Os sofás de espera são antigos, de couro caramelo, combinando com as paredes da casa.

Me sento do lado oposto a uma senhora com cabelos pretos, fortes, muito característicos de alguém com ascendência libanesa. Os olhos estavam muito marcados e seus brincos brilhavam em contraste com a máscara descartável branca.

- Volta aqui, Salim! - Ela se dirigiu à criança que descia as escadas na frente do sofá.

Salim era um menino de cerca de 4 anos de idade, vestia uma camisa polo azul marinho e um jeans grifado. Estava vestido como um mini homem, ao invés de tênis, um mocassim de criança.

Nunca quis ter filhos, e quando eu era jovem, essa minha afirmação assustava as pessoas. Era quase entendida como \"não gosto de crianças\" pela maioria das pessoas. Agora que estou velha (com amor e humor), posso dizer que optei por não ter filhos sem experimentar estranhezas. Eventualmente uma ou outra, mas isso diz mais sobre quem reage do que sobre mim.

- Salim! Vem aqui com a vovó!

Acho filho um compromisso de prazo eterno, talvez por isso a não vontade. Minhas amigas mais waldorf - canga - no - parque - calendário - maia tentam me enfiar em dinâmicas de benção do útero, para eu fazer as pazes com meu feminino. Porém, nunca briguei com ele (risos). Obrigada, não vou nesse evento.

- Salim! Salim! Você vai cair daí, volta aqui.

A criança subia e descia os lances de escada de modo que entrava e saía do nosso campo de visão. O mini homem parecia impaciente.

- Olha o homem do saco, Salim! - se voltando para mim - Esse menino é impossível.

O pequeno homem se aproxima e ela o segura pelo punho.

- Escuta aqui, Salim, você vai cair dessa escada. A mamãe já vai sair da consulta, se você esperar bonzinho, o Homem do Saco não te pega...

Salim olha para mim, e volta a brincar de subir e descer a as escadas, mas desta vez, gritando.

- Ahhhhhhh Aaaaaaaaaa Uuuuaaaaaaaaaaaaaa!

A avó, se mantém polida, sentada de maneira elegante e coluna desencostada e ereta, pernas bem alinhadas, um sapato de salto. Acho chique quem usa salto alto para viver, para ir ao oftalmologista. É uma realidade diferente da minha. Todo o contexto daquela mulher. Parecia ser linda. Era uma avó sem cabelos brancos. Pela maneira como se sentava, parecia habituada a eventos sociais formais.

- Ahhhhhh uauauauauauauauaua aaaaauuuuuu uuuuauauauauaau!

Conforme a impaciência do pequeno homem e altura do seus gritos aumentavam, a mulher se recompunha no lugar. Ela parecia incomodada, ou será que era eu? Nós duas? A recepcionista também? A criança gritava alto e já estávamos ali com o silêncio entre nós preenchido pelos seu gritos há mais de 15 minutos.

- Essas crianças... - ela se voltou para mim - não tem jeito.... Salim! Olha, o homem do Saco está chegando aqui. Se você não ficar com a vovó ele vai te colocar no porta malas e te levar embora, você nunca mais vai ver a mamãe.

Por dentro, entrei no meu abismo e fiquei aterrorizada com a ameaça. Não fui raptada pelo homem do Saco, nem separada da minha mãe quando criança, mas quantos medos e fantasmas existem em mim mesmo assim?

Homem do Saco.

O incômodo parecia generalizado. A avó se arrumando no sofá, a criança aos gritos num sobe e desce de escadas, eu agora menos incomodada com os gritos e mais com o Homem do Saco.

Beth não fala, Beth, não é da sua conta, Beth, não se mete, Beth passa batido...

- Olha, Senhora, não tenho nada com isso, mas vai ser uma fortuna a conta da terapia dessa criança por causa desse Homem do Saco....

- Senhora, Elizabeth - disse a recepcionista - pode entrar na sala 04.

Terminada a consulta, ao assinar os papéis na recepção, notei a ausência da Avó, da Criança e do Barulho. Um vazio do incômodo. Uma volta para minhas certezas. Sapato bom é o confortável. Barulho bom é aquele que a gente escolhe.

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Consegui uma promoção de lentes multifocais e fui aproveitar meu último mês de plano de saúde para deixar o grau em dia.

- Volta aqui, Salim! - Ela se dirigiu à criança que descia as escadas na frente do sofá.

Salim era um menino de cerca de 4 anos de idade, vestia uma camisa polo azul marinho e um jeans grifado. Estava vestido como um mini homem, ao invés de tênis, um mocassim de criança.

- Salim! Vem aqui com a vovó!

- Salim! Salim! Você vai cair daí, volta aqui.

A criança subia e descia os lances de escada de modo que entrava e saía do nosso campo de visão. O mini homem parecia impaciente.

- Olha o homem do saco, Salim! - se voltando para mim - Esse menino é impossível.

O pequeno homem se aproxima e ela o segura pelo punho.

- Escuta aqui, Salim, você vai cair dessa escada. A mamãe já vai sair da consulta, se você esperar bonzinho, o Homem do Saco não te pega...

Salim olha para mim, e volta a brincar de subir e descer a as escadas, mas desta vez, gritando.

- Ahhhhhhh Aaaaaaaaaa Uuuuaaaaaaaaaaaaaa!

- Ahhhhhh uauauauauauauauaua aaaaauuuuuu uuuuauauauauaau!

Homem do Saco.

O incômodo parecia generalizado. A avó se arrumando no sofá, a criança aos gritos num sobe e desce de escadas, eu agora menos incomodada com os gritos e mais com o Homem do Saco.

Beth não fala, Beth, não é da sua conta, Beth, não se mete, Beth passa batido...

- Olha, Senhora, não tenho nada com isso, mas vai ser uma fortuna a conta da terapia dessa criança por causa desse Homem do Saco....

- Senhora, Elizabeth - disse a recepcionista - pode entrar na sala 04.

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O Homem do Saco

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