{"status":200,"response":{"result":"PUBLIC_ARTICLES_RETRIEVED","data":{"count":1,"content":[{"id":"60fdc7f145c43f55456750c2","updated":"2021-07-28T05:28:47.096Z","created":"2021-07-25T20:22:09.720Z","statuses":{"approval_status":"approved","publish_status":"published","visibility_status":"public","has_pending_changes":false,"is_pinned":false,"is_paywall_disabled":false,"scheduled_date":null,"rejection_reason":null},"metadata":{"location":"home","location_slug":"blog","content_type":"post","publish_date":"2021-07-27T17:22:27.720Z","likes_count":0,"bookmarks_count":0,"comments_count":0,"score":"2021-07-27T17:22:27.720Z","sharing_title":"Viajam porque amam e voltam pelo o mesmo motivo","sharing_description":null,"sharing_image":"https://5f1ae31a2b397e299b74e383.redesign.static-01.com/f/images/542f60a7310dea34b32205aaf039faf5d9031d16.png","tag_ids":["5fc3ba6c44e0e02c21bb2f37","605ff41da2289865206e433c","60fdc7f145c43f55456750c0","60fdc7f145c43f55456750c1"],"author_user_id":"60268b10b7734866b0376379","moderator_user_id":null,"project_id":"5f1ae31a2b397e299b74e383","course_id":null,"course_module_id":null,"group_id":null,"version":1,"tags":[{"id":"5fc3ba6c44e0e02c21bb2f37","title":"etnografia","slug":"etnografia","project_id":"5f1ae31a2b397e299b74e383"},{"id":"605ff41da2289865206e433c","title":"comunidade","slug":"comunidade","project_id":"5f1ae31a2b397e299b74e383"},{"id":"60fdc7f145c43f55456750c0","title":"Caminhoneiros","slug":"caminhoneiros","project_id":"5f1ae31a2b397e299b74e383"},{"id":"60fdc7f145c43f55456750c1","title":"Greve dos Caminhoneiros","slug":"greve-dos-caminhoneiros","project_id":"5f1ae31a2b397e299b74e383"}]},"content":{"title":"Viajam porque amam e voltam pelo mesmo motivo","slug":"viajam-porque-amam-e-voltam-pelo-o-mesmo-motivo","cover_image":"https://5f1ae31a2b397e299b74e383.redesign.static-01.com/l/images/542f60a7310dea34b32205aaf039faf5d9031d16.png","headline":"Há quem diga que a estrada tem dono, mas se fosse possível descrever quem são os(as) caminhoneiros(as), seriam as pessoas que possuem permissão para, além de andar, viver por ela.","main_content":"

Há quem diga que a estrada tem dono, mas se fosse possível descrever quem são os(as) caminhoneiros(as), seriam as pessoas que possuem permissão para, além de andar, viver por ela. Juntos, eles formam um grupo diverso que, mesmo separados por quilômetros e rodovias, são unidos entre si e compartilham muitas vezes do mesmo sentimento.

Eu não sou caminhoneira, não tenho parentes e nenhum amigo. Mas eu já precisei pesquisar sobre para poder me relacionar melhor com eles ou entender o que os motivam. Afinal, eu tinha a responsabilidade de fazer conteúdo para duas marcas de caminhão e representar a marca era quase como ter um relacionamento e fazer parte do grupo, já que muitos posts eram sobre o dia-a-dia deles, necessidades e até dicas de trânsito. Isso sem falar que eu também era responsável pelas interações, então todas as dúvidas e comentários eu também respondia.

Dessa forma pude descobrir alguns desejos e angústias que me fizeram ver a Greve dos Caminhoneiros, em 2018, com outro olhar que antes eu não seria capaz. Pude entender melhor o que eles reivindicavam, pois tinha entendido um pouco do custo que é ter um caminhão, o impacto que o trabalho deles tinha na economia e na sociedade. Isso sem falar em como os motoristas tinham que abdicar de muita coisa por conta da profissão. A Greve foi um manifesto político e uma maneira deles se posicionarem.

Na época, eu também consegui entrar em um grupo de Facebook. Descobri que era comum dividirem pontos seguros e agradáveis para fazerem a parada e que o valor a ser cobrado por um frete era um dos pontos mais discutidos entre eles, uma vez que era nítido como eles não queriam recusar trabalho, mas se viam muitas vezes pressionados a cobrar um valor menor ou se virar pra diminuir o tempo de entrega.

O fato de exercerem a mesma função, passarem por dificuldades semelhantes faz com que os caminhoneiros tenham uma configuração específica que os diferencia do restante da sociedade e os une mais ainda enquanto comunidade. Esse fator pode ser explicado por meio dos princípios da divisão do trabalho, que Durkhein (1977)) analisa a partir da interação social e define como fator responsável pela manutenção e continuidade das relações entre o grupo. Os caminhoneiros possuem um vínculo entre si que opera como uma força que os mantém ligados ao grupo e por consequência às estradas.

Com um olhar mais direcionado para a comunidade, passei a me relacionar melhor com eles. Entendi como falavam, o que merecia a atenção deles e coisas básicas como a parte da frente do caminhão se chamar boleia e que ela, muitas vezes, pode carregar bem mais que uma carreta dado o valor das coisas que nela estão.

Depois, além de entender alguns jargões, eu procurava por temas que pudessem auxiliá-los também na estrada e na segurança deles enquanto viajavam devido. Foi então que me vi jogando no google o que era “rebite” e me deparei com uma triste realidade de que muitos são viciados nos comprimidos. E assim, da mesma forma que dividiam as dores de ter que correr contra o tempo, eles dividiam as “dicas” para se manterem acordados.

O meu olhar para essa comunidade iniciou quando precisei fazer conteúdo. Porém, anos depois sendo estrategista para uma marca de rastreadores, vi outro lado. O da produtividade. Até parecia que eu conhecia a classe, pois eu sabia qual caminhão era o sonho de consumo deles e já tinha até dado umas dicas para equilibrarem o peso da carga e evitarem acidentes na estrada. Já fiz post emotivo para o Dia dos Pais e já vi caminhoneiro expressar que vivia muito tempo longe da família e mesmo quando estava perto, se sentia distante, pois tinha que se dedicar a manutenção do caminhão para seguir a próxima viagem.

Resumindo, eu vi o ditado “tempo é dinheiro” ser aplicado na máxima, mas acontece que dessa vez quem o aplicava não eram os próprios caminhoneiros sobre si e sim o gerente da frota.

O principal motivo do uso desse rastreador não era para a segurança da carga ou do caminhoneiro, e sim para verificar o quão produtivo eles eram e o quanto permaneciam em movimento. Por mais o Código de Trânsito Brasileiro tenha instaurado a lei do descanso, que estabelece um descanso de 11 horas a cada 24 horas, eu percebi que alguns aplicativos usavam o rastreador por satélite para precarizar a profissão. Dessa forma, ofereciam um valor de frete abaixo do mercado como se tivessem uma frota e assim o motorista se via obrigado a aceitar um freelancer ou negociar por si só a sua remuneração, seu tempo de trabalho e tendo que inclusive, arcar com os custos do seu trabalho sozinho.

Acontece que a carga é pesada. Ser caminhoneiro é basicamente andar sobre divisas das estradas e da vida. Não há placa de caminhão que consiga descrever como é estar sempre dividido entre a família e a estrada, entre a beleza do ir e o aconchego do ficar, entre se encontrar em comunidade e se sentir deslocado do resto da sociedade, entre conhecer muitos lugares e estar sujeito aos perigos da estrada e claro, entre acordar cedo e conseguir se manter assim o máximo que conseguir.

Houve o tempo em que o caminhão e as pessoas que o dirigiam preenchiam o imaginário coletivo de mudança, progresso, pioneirismo e aventura. Goulart (1959) afirmava que em 1950, os caminhões se tornaram mais eficientes que os trens e rapidamente superou todos os outros transportes de cargas da época. Estranho pensar que no período em que mais se precisa do tráfego de mercadorias e alimentos, os caminhoneiros são colocados de escanteio.

No início da pandemia, agora em 2020, mesmo depois de terem provado o seu valor para a sociedade ao paralisarem o Brasil por conta Greve dos Caminhoneiros, eles estavam sendo impedidos de pararem para comer em locais que antes estavam acostumados e assim dirigiam por aí sem ter o comer ou sem ter um banheiro pra usar.

Diante de todas essas dificuldades, só o amor pela estrada seria capaz de colocá-los nela, mas o que os mantém, definitivamente, é a necessidade. A necessidade do povo ser reabastecido dia após dia com tudo o que ele consome e o fato da economia não poder parar. Ainda bem que pelo menos a estrada oferece passe livre (tirando alguns lugares que o homem colocou pedágio). Afinal, é difícil fazer parte de uma comunidade com um vínculo tão forte entre si e ao mesmo tempo tão deslocada da sociedade como um todo.

Bibliografia:

Aparecida, V. e Monteiro, M. Estilo de vida, aspectos de saúde e trabalho de motoristas de caminhão. SciELO, 2010

Disponível em: <https://www.scielo.br/j/reben/a/SfX3fnBfK7bfVtFbFzMHtPD/?lang=pt#> Acesso em 14 de junho de 2021

DURKHEIM, É. As regras do método sociológico. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1977.

Goulart, J. A. Transportes nos engenhos de açúcar. Rio de Janeiro: Edição do Instituto de Açúcar e do Álcool, 1959.

Guilem, F. Caminhoneiros de Maringá Passam Fome nas Rodovias por Falta de Comida, 2020.

Disponível em: GMC Online

<https://gmconline.com.br/noticias/cidade/caminhoneiros-de-maringa-passam-fome-nas-rodovias-por-falta-de-comida/> Acesso em:15 de junho de 2021

Moura, R. Longe de casa, caminhoneiros seguem rotina na pandemia e sofrem preconceito, 2020
Disponível em Tab Uol:

<https://tab.uol.com.br/noticias/redacao/2020/06/07/longe-de-casa-caminhoneiros-seguem-rotina-na-pandemia-e-sofrem-preconceito.htm> Acesso em:15 de junho de 2021

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