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Etnocentrismo x Relativismo Cultural

Etnocentrismo x Relativismo Cultural
Marina Schieferdecker
fev. 17 - 5 min de leitura
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Na última experiência que descrevi, Um Natal um tanto estranho, alguns pontos foram os que mais geraram estranhamento:

O pequeno número de pessoas no evento, a vídeo chamada, o silêncio e calmaria, o fato de presentear mesmo sem precisar, a organização e o fato de ter terminado muito cedo.

Em grande parte do texto acredito ter trazido uma lente alinhada com o relativismo cultural, já que busquei observar aquela cultura sem classificá-la como melhor ou pior do que a que estou acostumada a experimentar. Ainda que de forma superficial, a motivação ou “o ponto de vista” nativo também foi observado.

 


 

Contudo, recentemente me deparei com outro evento que gerou muita reflexão para mim e para as pessoas a minha volta e pude observar a lente etnocêntrica que algumas pessoas com quem estava convivendo tiveram, não tentando entender o ponto de vista nativo, mas sim julgá-lo com base em sua própria realidade.

Fomos passar alguns dias de verão em uma ilha mais afastada e reclusa. A opção foi feita para podermos ir para uma praia que não tivesse aglomeração e com preocupações menores relacionadas à pandemia.

Ao chegarmos na Ilha, nos deparamos com uma estrutura mais simples e com uma situação precária para seus moradores. Diversos fatores que impactam na saúde relacionados ao saneamento básico como água potável, coleta de lixo e energia elétrica, não sei se é recorrente, mas presenciamos diversos dias da ilha sem luz.

Outro ponto também foi que nos indicaram consumir as coisas da ilha para auxiliar os moradores, já que é uma forma de renda para muitos. Como garantia levamos alguns itens que não estariam disponíveis lá e alimento para algumas refeições. O plano era comprar peixe e camarão, entre outros, mas não havia nenhum tipo de fruto do mar para comprar no local.

Bom, chegando na lente etnocêntrica. O que mais chocou algumas pessoas que estavam comigo, foi que os moradores estavam “acomodados” com essa situação, são resistentes a mudança e a qualquer tipo de conselho ou tentativa dos turistas para a melhoria de suas condições.

Ficaram revoltados de como eles não buscavam resolver seus problemas e melhorar sua qualidade de vida. Deviam ter uma forma de tirar o lixo, desenvolver melhor o comercio, ter peixe para vender, e até algumas lojinhas com artesanato.

Não fiquei tempo suficiente para conseguir conversar com muitos nativos, até para eles contarem de forma mais aberta o seu ponto de vista. O exercício que busquei fazer foi de tentar analisar esses pontos sem preconceitos, sem impor o meu estilo ou padrão de vida.

A questão do lixo era de responsabilidade da prefeitura, que a duas semanas não passava para recolher. A ilha pertence à um município do continente, com a mudança de mandato uma nova licitação precisou ser feita e isso ainda estava em andamento. Sim, talvez algo pudesse ter sido feito, mas acredito que como verão é o momento com mais turistas a maioria estava envolvida com outros afazeres.

 

As questões da disponibilidade do peixe e da falta de interesse com os turistas pude observar no final de semana.

A Ilha fica muito próxima das principais praias da região e é um berçário de golfinhos, é impressionante a quantidade e a proximidade que eles chegam de nós. Contudo a água é mais lodosa e a estrutura é mais precária, por isso a ilha vira um destino de passa dia. Diversas lanchas e jet-ski começam a chegar no final da manhã, as pessoas almoçam e de tarde voltam para as praias do continente.

A maioria dos peixes e frutos do mar que os pescadores da ilha conseguem, são direcionados para os restaurantes locais ou revendidos para o continente já que é uma das principais fonte de renda dos locais. Como são poucas as pessoas que ficam lá as peixarias acabam não contando com essa demanda.

Já com relação aos turistas, sim, são uma fonte de renda muito importante, mas a maioria desses ficam poucas horas e acredito que deixam seus rastros e sensações não muito agradáveis para os nativos.

As questões relacionadas ao saneamento básico e saúde deveriam ser melhoradas e os governantes precisam dar o mínimo para a população. Mas esse é outro problema.

E sim, existem coisas que poderiam ser feitas para desenvolver mais o comércio e a estrutura, para melhorar essa parte da qualidade de vida deles, como falaram os que me acompanhavam. Mas será que é preciso? Eles vivem em uma ilha, em um outro ritmo que o nosso, com outras prioridades. Aqui é importante o olhar com relativismo cultural, aqui é preciso entender o ponto de vista deles antes de promover ou indicar qualquer tipo de mudança.


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